terça-feira, outubro 26, 2010

Porque o Foo Fighters já é melhor que o Nirvana

A trágica morte de Kurt Cobain fez nascer uma das bandas top do novo século, com seu sétimo álbum de estúdio já a caminho



Foi uma apresentação chocante.

Só me lembro de ver Kurt Cobain numa espécie de catarse, destruindo de forma fria e calculista a guitarra sobre o palco do Morumbi. Era 16 de janeiro de 1993, auge do verão brasileiro. E a galera presente – borbulhando mais que o calor da estação – entrava em êxtase enquanto testemunhava o líder do Nirvana sacrificar o seu instrumento no festival Hollywood Rock, relembrando Pete Townshend, Jimi Hendrix e outras lendas. Só que como se estivesse hipnotizado. Possuído  Foi também um show marcante – e até hoje continua no Top 10 dos que pude presenciar, com 21 anos de idade apenas.


Lá perto de Kurt – mais precisamente, atrás do kit de bateria – estava David Grohl. Até então, Grohl recebia muitos elogios por sua entrega total ao instrumento. Mas a realidade, era que o nativo do estado de Ohio, não passava de um mero coadjuvante. Afinal, Kurt só era tímido e depressivo nos bastidores.  Ele era, e seria o imperador do grunge até a sinistra data de 4 de abril de 1994, quando foi encontrado já sem vida em sua residência de Seattle.

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Julho de 1995. Uma segunda vida começava – ainda que forçada – para David Grohl. Em menos de seis meses após a morte de Kurt, era verdade que o baterista estava longe de se livrar do trauma e do fantasma do músico.  Mas o lançamento de um álbum era tudo o que ele precisava para se libertar do fardo e, segundo suas próprias palavras, “provar que poderia fazer algo bom sozinho." Assim, apanhou quarenta músicas que vinha colecionando desde 1989, compostas entre um show e outro de sua ex-banda e chamou o produtor Barrett Jones para escolher e cortar as escolhidas a integrar o álbum de estréia de seu novo veículo pop: o Foo Fighters.

O que pouca gente sabia naquele momento, é que o Foo Fighters se resumia ao próprio Grohl. Ninguém, a não ser o ex-Afghan Wings, Greg  Dulli (guitarras na ótima faixa “X-Tactic”), tocou um instrumento sequer no disco homônimo.  A história era feita: o relutante David Grohl deixava de ser um ex-Nirvana para liderar seu próprio grupo com uma diferença sutil. As músicas recheadas de peso, escuridão e angústia que permeavam In Utero – o canto de cisne de Cobain – davam espaço a um rock que unia traços fortes do punk, com melodias mais elaboradas e vocais mais flexíveis.

A prova de que o Foo Fighters era mais do que um foguete experimental estava no som que saiu daquele embrião musical. “This Is A Call”, “Big Me”, “I’ll Stick Around”, “Exhausted” eram faixas de construção simples, mas cartões de visita de peso. Contudo, mesmo com tantas provas de que David Grohl queria vencer fora do Nirvana, as perguntas sobre seu parceiro caído não iriam calar.  Não que Grohl as respondesse. A única pista dada por ele era de que uma das músicas falava sobre o tormento que agora viúva Courtney Love causava em sua vida.  Quando perguntado se o verso “Como pode ser só eu que enxergo essa sua pseudo-insanidade” (de “I’ll Stick Around”) era sobre Love, David deixou escapar à revista Rolling Stone:

“Talvez".

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Outubro de 2010.  O Foo Fighters é hoje uma banda consagrada e duela em número de fãs com o Nirvana. Sempre gostei de Nevermind. Uma obra bem feita e visceral. Seu sucessor, In Utero, não chegou nem perto. Não que o single “Heart-Shaped Box” não causou impacto. Mas o teor destrutivo da composição me deixava meio perturbado. De fato, o Nirvana não teve tempo de mostrar o que sabia. Já o Foo Fighters não ficou na promessa, e ousa em misturar punk, metal e até bossa nova.


Com a ajuda de Butch Vig (sim, o mesmo produtor do seminal Nevermind), o Foo Fighters promete entregar o sétimo álbum de estúdio no ano que vem. Junto a ele, tudo leva a crer que o peso das guitarras deve relembrar que o grupo não se contenta mais em ser um coadjuvante para o Nirvana. Ou mesmo ser meramente conhecido como a “segunda melhor banda” de David Grohl”.

Para aguçar os fãs e ratificar de que – para muitos – o Foo Fighters é hoje melhor, sim, do que o Nirvana em termos técnicos e poéticos,  o CD sucessor de Echoes, Silence, Patience & Grace foi gravado quase todo na garagem de David, com o velho tape analógico e com a ajuda de dois “reforços”:  Krist Novoselic (sim o baixista daquela banda...) e Pat Smear, guitarrista original do Foo Fighters.

Sobre o disco, David Grohl jura: “Eu já sei como o disco vai soar e mal posso esperar até que as outras pessoas o escutem. Os fãs de Foo Fighters vão surtar, sinceramente, porque é demais".

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Claudio D. Dirani é editor de jornalismo da Alpha FM 101.7, autor de Paul McCartney – Todos os Segredos da Carreira Solo e U2 – História e Canções comentadas